#15 A tragédia no Rio Grande do Sul, a justiça climática e o setor privado
ESG não pode ser mero discurso de marca. Se sua organização de fato se preocupa com o meio ambiente, com a sociedade e com as comunidades em que atua, as reflexões desta Farol são para você
Só existe um assunto possível para esta edição da Farol da Economia Regenerativa*: a tragédia climática que desde a semana passada afeta o Rio Grande do Sul.
Mas já há muitos veículos e profissionais de imprensa fazendo uma excelente cobertura factual sobre esse triste evento extremo que é, sim, consequência das mudanças climáticas, mas que foi agravado por outros fatores como falta de planejamento, inação política e até mesmo negligência.
Além disso, os caminhos para enviar ajuda – financeira ou por meio de doações – também já foram amplamente divulgados, e é inegável que a onda de solidariedade que se formou nos últimos dias tem um papel fundamental para a reconstrução do estado.
E ainda, eu sei que você que nos acompanha já tem boas fontes de informação para se manter atualizado sobre o que está acontecendo no Sul do país e que sabe como contribuir para amenizar pelo menos um pouco o sofrimento da população afetada, que conta com a incansável ajuda de voluntários, ONGs e ativistas, e com a atenção do poder público e até de marcas.
Como podemos agregar?
Decidi trazer para este espaço algumas reflexões sobre o papel do poder privado não no apoio imediato (que também já está em pauta em vários canais), mas na construção de um futuro mais justo, equitativo e regenerativo – que defendemos diariamente em A Economia B.
Vamos falar sobre educação climática, justiça social, justiça climática, consumo excessivo, redução nas emissões de metano e tendências na área ambiental a que sua organização precisa estar atenta para de fato fazer diferente – e fazer a diferença.
É sempre hora de provar que ESG não é só discurso de marca, colocando em prática ações que mostram que a empresa DE FATO se preocupa com o meio ambiente, com a sociedade, com as comunidades em que atua. Mas agora é ainda mais hora. E a curadoria que trazemos a seguir pode ajudar nos próximos passos.
Por fim, é importante lembrar que 2024 é ano eleitoral no Brasil. Quando for escolher a quem dar seu voto para vereador, prefeito/vice-prefeito, preocupe-se em entender como eles enxergam a crise climática e quais são seus planos para mitigar os efeitos das mudanças climáticas e adaptar nossas cidades a uma nova realidade ambiental. Essa é a pauta mais importante do século. Se não estiver no plano de ação de seu candidato, ele não merece seu voto.
Neste episódio do podcast Estadão Notícias (que eu recomendo muito que você ouça), o cientista climático Carlos Nobre diz que as próximas gerações não verão um cenário menos pior em termos climáticos. Agir para ao menos controlar os efeitos dessa emergência é um dever coletivo.
Natasha Schiebel
Diretora de Conteúdo A Economia B
PS: Se quiser fazer algum comentário, dar uma sugestão de pauta ou só trocar uma ideia, fique à vontade para me escrever – natasha@aeconomiab.com
*Farol da Economia Regenerativa é a newsletter semanal d’A Economia B.
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[Reportagem] Educação climática salva vidas em comunidade pernambucana
Em maio de 2022, Jaboatão dos Guararapes, na região metropolitana do Recife, enfrentou fortes chuvas que resultaram em 64 mortes. No entanto, na comunidade do Retiro, a história foi diferente dos outros bairros: o local não registrou nenhum óbito. A razão para essa discrepância não estava nas condições socioeconômicas ou na infraestrutura das moradias, mas sim em outro fator: a educação dos jovens e adultos sobre as mudanças climáticas e os riscos dos desastres.
Nesta reportagem, Gabriel Gama (da Agência Pública), conta como o ensino sobre eventos extremos ajudou a comunidade de Pernambuco a se proteger.
[Debate em pauta] O que as empresas têm a ver com justiça social?
Fome, pobreza, falta de acesso a serviços básicos, falta de emprego decente, desrespeito aos direitos humanos, mudanças climáticas, discriminação e violência racial e de gênero. Todas essas questões (e outras mais) são geradas, impactadas e agravadas pela desigualdade social e econômica dentro das nações e entre os países.
Sistemas excludentes em diferentes esferas da sociedade fazem com que um grupo de pessoas seja desproporcionalmente prejudicado e impactado pelos principais problemas socioeconômicos globais.
Seja qual for a crise (econômica, de saúde, social), é certo que a parcela mais vulnerável da população será a mais atingida. Da mesma forma, a desigualdade em si vivenciada por esse grupo gera uma série de desafios sociais (desemprego, violência e mais exclusão).
Além disso, se não tratada, a desigualdade é um monstro que se autoalimenta.
Diversos fatores combinados dentro desse sistema criam um círculo vicioso em que a concentração de riqueza e os privilégios de uma minoria se perpetuam, dificultando ainda mais a mobilidade social e a redução das desigualdades.
É por isso que a Justiça Social é fundamental para o desenvolvimento sustentável. Essa é uma questão crucial para a construção de uma sociedade mais justa e equitativa, onde todas as pessoas tenham acesso aos mesmos recursos e oportunidades.
Mas por que as empresas deveriam se preocupar com justiça social? Quais são as recomendações e boas práticas para marcas que querem se posicionar em questões sociais e ajudar a diminuir as desigualdades lendo esta reportagem? Respondemos a essas e outras perguntas neste artigo.
Pensamentos que iluminam e ecoam
“Quando a gente falava de mudanças climáticas, de emergência climática, parecia que a gente estava focando só no problema – temos um grande problema, temos uma emergência, temos um fogo para apagar. Quando a gente fala de justiça climática, a gente fala: temos ação para fazer, temos que conceder justiça, temos que garantir direitos a pessoas que já estão desproporcionalmente sendo impactadas pelas mudanças do clima; é um conceito que chama muito mais para ação.”
Priscilla Santos, advogada, especialista em financiamento climático e consultora do clima
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[Entrevista] O que é justiça climática e o que sua empresa tem a ver com isso?
Priscilla foi a convidada do 5º episódio do A Economia B Entrevista, programa em que conversamos sobre assuntos essenciais para o setor corporativo em tempos de emergência climática, ESG e negócios de impacto, com pessoas que estão liderando a transformação da economia.
Baseada em Roma, ela conta, por exemplo, como a Itália conseguiu fazer com que as mudanças climáticas se tornassem uma pauta comum ao país – da extrema direita à extrema esquerda –, e sugere caminhos para o Brasil.
Por ter uma vida dedicada à justiça climática, Priscilla tem falas fortes para explicar a urgência em que vivemos.
A justiça climática é um dos maiores desafios de nossa geração, e ela nos ajuda a entender isso. “Temos um longo processo para convencer os brasileiros de que as mudanças climáticas estão afetando suas vidas. Por mais que já falte água na torneira e a conta de luz esteja caríssima, esse nexo causal entre isso e o clima não está claro para o brasileiro médio”, analisa.
Você sabia que…
… 80% das maiores empresas do mundo dizem estar expostas a riscos associados às mudanças climáticas – seja em termos de impactos físicos ou de alterações no mercado?
Os riscos físicos se referem, por exemplo, à exposição a eventos climáticos extremos ou mudanças climáticas mais abrangentes, como o aumento das temperaturas ou do nível do mar.
Já os riscos de transição de mercado envolvem as consequências de mudar para uma economia de baixo carbono, como regulamentações que tornam os combustíveis fósseis mais caros.
[Para inspirar] Empresas que são forças para o bem
A descarbonização continua sendo central nos esforços para combater a crise climática. Contudo, como contamos no Estudo B #6 – Tendências ESG para 2024, cada vez mais devemos ver ações focadas em diminuir também as emissões de metano (CH4).
Afinal, o CH4 – que é o principal componente dos combustíveis fósseis – tem um poder de aquecimento 80 vezes maior do que o CO₂ durante seus primeiros 20 anos na atmosfera.
Além disso, segundo a Agência Internacional de Energia (IEA), esse gás é responsável por cerca de 30% do aumento médio da temperatura global desde a Revolução Industrial.
E ainda, o último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) estima que entre 50% e 65% das emissões de metano vêm de atividades humanas.
A pecuária é responsável por cerca de 22% das emissões de metano globais. Para ajudar a resolver esse problema, a Beeotec, uma startup brasileira de biotecnologia, desenvolveu um suplemento natural para a alimentação do gado que melhora a imunidade e a digestibilidade do animal. Além de reduzir custos com insumos, a inovação ajuda a diminuir significativamente a emissão de metano dos rebanhos.
A startup Windfall Bio usa micróbios para transformar metano em nutrientes para o solo. Os micróbios são “alimentados” com metano de esterco animal, usando um sistema de lonas e canos, e, por sua vez, produzem fertilizantes que podem ser usados em plantações. Além de fazendas e criações de gado, a ideia é fornecer os micróbios para locais onde o metano é criado, como aterros sanitários, estações de tratamento de água e no setor de combustíveis fósseis.
A Danone assinou o Global Methane Pledge, estabelecendo a meta de reduzir em 30% as emissões absolutas de metano provenientes do leite fresco usado em seus produtos lácteos até 2030. Para isso, a empresa comprometeu-se a trabalhar com agricultores para implementar práticas regenerativas e desenvolver soluções inovadoras, colaborando com parceiros para ampliar inovação, relatórios e avançar modelos de financiamento.
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[Podcast] Tendências ESG 2024 – E de Ambiental
Célia Linsingen é doutoranda e mestre em Administração, especialista em marketing, branding e inovação. Hoje, além de consultora, mentora, professora e palestrante, ela também é apresentadora do excelente podcast Tendências de Mercado e Consumo.
Na semana passada, recebemos com alegria a notícia de que Célia decidiu produzir uma série de episódios especiais sobre tendências ESG tendo como uma das principais fontes o nosso Estudo B #6. 🙂
No programa que abre a série, ela resume as principais tendências ambientais que já estão impactando o mercado corporativo e traz ótimas análises e insights complementares.
Por falar em Estudo B #6…
Deu n’A Economia B
🌳 Plataforma “prevê” desmatamento na Amazônia
Utilizando uma combinação de fatores macroeconômicos e governança local, Floresta em Risco – plataforma desenvolvida pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) em colaboração com o Banco Mundial – oferece previsões sobre áreas suscetíveis a desmatamento e perda de vegetação nativa na região, fornecendo insights para políticas públicas e ações privadas de conservação.
⭐ [Cobertura internacional] Revolucionando a economia azul
No MadBlue Summit (evento que aconteceu no fim de abril, em Madrid), cerca de 60 startups de impacto apresentaram suas soluções e inovações voltadas para os principais desafios de desenvolvimento sustentável. Um júri de especialistas elegeu os melhores projetos em cada uma das áreas temáticas – Energia limpa; Cidades inteligentes; Segurança alimentar e acesso à água; Impacto social e pessoas; Tecnologia e nova economia. Conheça os vencedores do MadBlue Impact Award e outras quatro startups que chamaram nossa atenção durante o evento.
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[Documentário] The Shitthropocene: a era das porcarias baratas
Não dá para culpar ninguém individualmente pelas mudanças climáticas e suas consequências catastróficas para o planeta e para a humanidade. Mas dá, sim, para dizer que o consumo excessivo é um dos grandes vilões dessa emergência que afeta a todos – em maior ou menor grau.
O novo filme da Patagonia (marca reconhecida mundialmente por seu ativismo em defesa da Terra) explora como chegamos à “era das porcarias baratas” (que vão parar em lixões pelo mundo depois de pouco uso) e por que o impulso em direção a mais poderia nos destruir completamente.
“Se esperamos sobreviver como espécie, é hora de recuar nas porcarias baratas, descartáveis e planejadas para obsolescência que estão presentes em todas as nossas indústrias e começar a nos enxergar como donos de produtos, não apenas consumidores”, alerta a marca.
O filme é divertido, informativo e ao mesmo tempo assustador. Apesar de ainda não ter legendas em português, no YouTube é possível ativar as legendas automáticas.
Pra seguir pensando
[Instagram Bits to Brands] Como a sua marca pode fazer a diferença no maior desastre ambiental dos últimos tempos no Brasil?
[G1] Maioria dos municípios brasileiros está despreparada para eventos climáticos extremos, diz pesquisa
[The Intercept] Enchentes no RS: leia o relatório de 2015 que projetou o desastre – e os governos escolheram engavetar
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